A Questão Costa-Pinto

30/06/2009 at 12:10

A questão que se avoluma desta vez contra o Secretário Estadual de Cultura, Marcio Meirelles, é a da suposta falência do Museu Carlos Costa Pinto – maior acervo privado de peças históricas do país.

Em que pese que desde já deixo claro uma coisa: a culpa não é, como Mário Kertzs et caterva têm alardeado, da Secretaria de Cultura. Não houve corte de verba, mas retificação. O Costa Pinto continua recebendo o teto máximo de repasse permitido pelo Tribunal de Contas do Estado, como mostra o blog da SECULT.

Por outro lado, se a culpa não é de Marcio, a responsabilidade politicamente será. E com razão.

Não se quer dizer, com isso, que cabe ao Estado arcar com os ônus de um museu privado, por mais importante que este seja. O Teatro Castro Alves, estatal, não é plenamente financiado pelo Estado: parte de seu orçamento vem do aluguel de sua pauta na sala principal (uma das mais caras da América Latina, e com razão), e do cachet de apresentação de suas duas Sinfônicas (Neojibá e OSBA – esta última apenas quando fora do estado da Bahia) e de seu corpo de baile permanente.

A questão do Costa Pinto se relaciona por um lado com uma visão museológica elitista e arcaica por parte da instituição (e que não era presente no Governo do Estado mesmo durante o carlismo), e a total falta de visão do empresariado bahiano.

Senão vejamos. O maior museu privado do Brasil fica no Rio de Janeiro: a Coleção Castro Maia, dividido em duas sedes: a Chácara do Céu, em Santa Tereza, e a Chácara do Açude, no Alto da Boa-Vista (próximo a Vista Imperial Chinesa e a Capela Mayrink). E, como se pode ver na página do Museu, é mantida pelo Bradesco (que Dr. Castro Maia ajudou a fundar, nos anos 50) e através da venda de ingressos e de reprodução de parte de seu acervo, e aluguel de espaço para eventos. Algumas vezes, alugam para o Estado do Rio de Janeiro – e o Governo aí entra como comprador de serviço, não como financiador.

Por que o Costa Pinto, cuja origem é similar (a residência e coleção particular de um empresário nacionalista e com visão cosmpolita), não se matém assim? Porque o empresariado bahiano não vê ganho algum em financiar museu – prefere financiar abadá de bloco.

Exemplo. Quando Jean-Paul Sartre fez 100 anos, a Aliança Francesa (na Ladeira da Barra, Corredor da Vitória) fez uma série de leituras dramáticas de sua obra-prima, Entre Quatro Paredes. A menos de meia quadra de distância ficava a sede do Curso Pré-vestibular e Colégio Sartre, na Graça. A quem os atores recorreram em busca de apoio e patrocínio. Negado. Alegação: a cota de patrocínio naquele ano tinha sido toda gasta com festas de axé e trios de carnaval…

Quando digo que a responsabilidade é do Secretário Meirelles, é porque cabe a ele também provocar uma mudança mais direta do empresariado bahiano. Chamar os grandes pra conversar (talvez não a Odebrecht, que faz sua parte desde sempre, com uso permanente do TCA para propaganda institucional, por exemplo. Mas Dr. Norberto é da estirpe de Castro Maia, Walter Salles e Carlos Costa Pinto. Da velha Bahia culta) e dizer-lhes: cabe a vocês promover a cultura patrimonial, junto com o Estado que ainda tem de fomentar a cultura popular; no Rio, em Sampa e em Minas é assim. Não é vocês que se queixam que a Bahia é “provinciana”? Então, comecem por deixar de ser.

Há o problema da elitização. O Costa Pinto é luxuoso, mas o Rodin Bahia também é. No entanto, este é mais convidativo ao povo, que se sente confortável de ir de chinela. O Costa Pinto não: elitizado, com funcionamento pouco profissional (o seu excelente Café Balangandã abre quando quer e bem entende), acaba sendo um museu para turistas. A população não o frequenta como frequenta o MAM Solar do Unhão e mesmo o Museu de Arte da Bahia, logo em frente no Corredor da Vitória. Com isso, o Costa Pinto segue um modelo “Pelourinho de ACM”: um patrimônio que a população bahiana não consegue reconhecer como seu – porque na prática segue a lógica prostituta e escravocrata de pertencer ao turista.

No limite, penso que o Costa Pinto pode sim ser estatizado. A Bahia tem know-how reconhecido em gestão de museus. E a cidade carece ainda de dois tipos de museus que as outras duas grandes capitais do país tem: um de Arte Contemporânea, como já disse antes, e um Histórico. O Costa Pinto faria as vezes deste último.