A Ônibus-filia da neo-Direita

27/01/2010 at 16:11

Ia deixar esfriar o assunto. Mas como amanhã vou pra Mauricéia Desvairada do Delta do Capibaribe frevar no Bloco da Saudade, e só volto segunda, vai logo aqui.

Eles adoram um buzú...

Eles adoram um buzú...

É notável como, subitamente, o João Henrique do segundo mandato passou a tratar os ônibus como se fossem a grande solução de transporte coletivo para a cidade. Em seu primeiro mandato, graças ao então Secretário Nestor Duarte (do PSDB), se reformou os planos-inclinados da Liberdade-calçada, Pilar e o Gonçalves e se reestabeleceu a rota marítima para as Ilhas (de Maré, bairro de Salvador) e Ribeira-Plataforma.

Pela primeira vez em décadas se optava pelo sistema multimodal, o que ajudou a reeleger João Henrique – aliás, “multimodal” aparecia em 11 a cada 10 discursos dele, embora a proposta concreta de multimodalidade estivesse no programa de Walter Pinheiro.

Agora não. Pede pro Estado comprar os trens do metrô em março de 2009 e, estações quase prontas, até hoje nem viagem de teste fez; planeja elevadores urbanos e vias marítimas até o Rio Vermelho, mas nem sinal de execução. E, entre as 10 capitais sede da Copa de 2014, Salvador é a que menos verba de mobilidade vai receber. Porque só mandou um projeto: via segregada para ônibus na Paralela.

Onde queremos chegar? O excelente Victor Hugo Soares dá a resposta. Veja abaixo:

A TARDE teve acesso, através de três fontes diferentes, a processo de 1.030 páginas do Serviço de Inteligência da Secretaria da Segurança. Escutas telefônicas da Operação Expresso autorizadas pela Justiça apontam para uma briga, nos bastidores, entre empresários de ônibus e as construtoras Odebrecht e OAS pela execução e gestão do projeto de vias exclusivas para ônibus em Salvador. Os dois grupos disputaram a obra de autoria da prefeitura, orçada em R$ 628 milhões, antes mesmo de ser lançada a licitação.

As investigações registram diálogos de Carlos Eduardo Villares Barral, coordenador do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo de Salvador (Setps), com empresários e autoridades, como o ministro Geddel Vieira. Investigado na Operação por suspeita de envolvimento no esquema de propina na Agência Estadual de Regulação (Agerba), Barral foi flagrado em pelo menos 16 escutas telefônicas, articulando a disputa para ganhar o projeto.

Nas gravações, o advogado pede ajuda ao ministro Geddel Vieira Lima e ao radialista Mário Kertész, na disputa com a OAS e a Odebrecht. Dono da Rádio Metrópole, Kertész mantém relações com Barral desde que comprou do advogado o antigo Jornal da Bahia, em 1990. O contato com Geddel, seria uma tentativa de Barral buscar apoio político, de acordo com o inquérito policial.

(Em tempo: a Odebrecht já se defendeu, dizendo que tem apenas comparecido civicamente a reuniões públicas. Sinceramente, acredito: não é do feito empresarial de Dr. Norberto ser pouco transparente).

Então é isso: o SETPS (parte dele, porque os empresarios de ônibus mais modernos já sacaram e têm dito que quanto mais multimodal melhor pra eles: atrai mais passageiros) deve ajudar a campanha natimorta de Geddel Vieira Lima ao Governo Estadual. Junto com a OAS. Eis porque o Prefeito Sa(n)tanizante de Salvador passou a achar ônibus o máximo!

Aliás, o PMDB geddelista tem uma queda por ônibus – até agora, apenas os intermunicipais. A Prefeitura João Henrique Carneiro virou isso mesmo: uma mistura nitroglicerinada de imprensa de baixo quilate, especulação imobiliária, e idolatria aos motorizados públicos e privados.

Para-além de que soluções horizontais (metrô, transmilênio, vias exclusivas de ônibus) para uma cidade vertical como Salvador sejam nulas, vai aí mau-caratismo político mesmo! Claro, é bom ter vias rápidas horizontais. Que poderiam ser, por exemplo, ciclovias! – desde que a oferta de elevadores urbanos fosse maior e mais descentralizada.

Aí, depois de desativada a excelente via exclusiva de ônibus da Avenida Maria Leal Ferreira (este blog se reserva o direito de homenagear o mestre gaúcho do urbanismo bahiano chamando a Avenida Bonocô pelo seu nome de batismo) para fazer metrô, João Henrique descobre que ficará uma área devoluta embaixo e… faz ciclovia!

Ora, o metrô não terá 7km em linha reta. Num trecho assim, vias exclusivas de ônibus são mais eficientes, e bicicleta também. Uma vez o metrô em funcionamento, você, leitor, optaria pela ciclovia abaixo dele gratuita, ou por pagar 4 reais pra uma viagem de 10 minutos?

Pode-se alegar que foi Imbassahy quem iniciou o metrô. E daí? Imbassahy iniciou a genial reforma do Largo Dois de Julho, caso de estudo internacional em revitalização de centros de metrópoles, e João Henrique estancou – está lá só 1/3 do projeto concluso (e que depois de pronto abrangeria ainda a Gamboa de Cima e o Largo dos Aflitos). Por que não estancou o metrô a tempo, João?

Aí, ele estanca agora, quando já é tarde demais, e não por um lampejo de clarividência. Por puro interesse pecuniário mesmo, que nem próprio é, e sim de seu manda-chuva.

* * *

Pano Rápido: Qual o sentido dos ônibus em Salvador usarem combustível, ainda que biodiesel (promovendo todo tipo de poluição, desde o barulho até o calor), quando temos a maior incidência solar do mundo, perdendo apenas pra Atenas, na Grécia? Atenas, onde os ônibus são movidos a painéis solares, na Grécia, um país mais pobre do que o Brasil. Perguntar não ofende…

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Em tempo, novamente: Amanhã às 19h, no Trapiche Adelaide, diversos escritórios de urbanismo apresentarão projetos para Salvador, a curto, médio e longo prazo. Tem desde projetos questionáveis como a construção de uma avenida paralela a Luiz Viana Filho (bravo governador eleito que evitou sua deposição pelo Regime Militar em 1967, e por isso este blog chama a Avenida Paralela com seu nome de batismo), até projetos de refluir Salvador para seu centro expandido, aumentar os elevadores urbanos, etc. Vale conferir. A partir desta apresentação, vários debates surgirão pela cidade por meses, antes de ser posto algo em prática. Louvável – apesar de João Henrique criminosamente não empossar o Conselho da Cidade, eleito em 2008, o que torna sua gestão francamente inconstitucional.

Tal encomenda de projetos é do Governo Estadual e da Prefeitura, juntos. Claro: fosse só a Prefeitura, não teria este grau de transparência, nem esta intenção de discussão pública democrática.

Até aí, tudo bem. Só que Grampinho (ele, ACM, O Neto), convidou literalmente qualquer um que queira e todo mundo para seu aniversário, no mesmo horário, no Hotel Fiesta. Boca livre!

Grampinho, um dos herdeiros da OAS e dos responsáveis pelo “endireitamento” de João Henrique no segundo mandato.

Aí tem coisa ou não tem?!