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03/01/2012 at 14:46

Poema que fiz em homenagem ao poeta bauhaus (e negro) americano e e cummings (sim, sem pontos depois da abreviação do nome:  E.E., para Edward Elstin, e tudo em minúscula, sempre) – e que acabou levando o 1º lugar no último prêmio de poesia do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco, SINTEPE. Fato estranho, como já observara, uma vez que o certame era temático em torno de um assunto sindical, a que este poema em nada responde.

Besteira compará-lo com Maiakovisky e Cabral. Ambos estão ligados a arquitetura enquanto projeto urbano maior, vastos espaços, poucos pontos de sustentação. Arcos, vãos livres, jardins. cummings não: poesia maciça, em bloco, onde nenhum espaço entre os versos e os termos pode ser criado. E não há “pontos de sustentação”: toda ela se apoia no chão. Tanto assim que sua pontuação gráfica – virgulas, travessões, pontos, exclamações – não tem nenhum valor semântico ou sintático, ao contrário do que se diz. São puro ornamento art-decor. São como os frisos laterais do Edificio Oceania (Salvador). Como as ruas convergentes de Tel Aviv (Israel). Como a ausência de brisa do Bairro da Glória (Rio de Janeiro).

A poesia de cummings, mínima, menor que a de Cabral, não dá espaço para vento, vãos livres, dentros-fora. Ela não tem nem dentro nem fora, porque só tem dentro e só tem fora. Não há jardins tampouco: é impossível brotar até mesmo um cogumelo ali.

Limpa de todo excesso, é a mais poluída das poesias. Poluída como as grandes cidades industriais do pré-guerra. É a Berlim de Weimar em forma de verso.

e <> e


um préd

io branco ro

(bótico)

busto

(abotânico

cerveja belga)

brota, como rosa morta

da mão direita (sem a esquerda)

de um negro 

liquidando o espaço

o partido

a entra(da)saí(da)

 

(mas não de dentro da mão

mas de dentro do chão da calçada

de onde a mão garimpou sua semente

im-plantando)


põe

ma(r)

cidade des

abi(li)tada

(cotó

?

)

suas palavras em ru

í

nas


e pedaços de letras, troços-des

tra(ba)lhas (sem emprego

algum

para estes pontos

estas

ex

clamações

estas

inter

rogações

clamando

rogando

do de-dentro dos verb

etes)


– torturar os termos

como a gestapo

a uma prostituta

judia

lésbica

comunista

fazer o conceito

confessar sua inverdade

amputar as pernas das palavras

diab

éticas

tirar-lhe o gos(t)o –

 

ninguém respira

dentro destes versos

:

todos que neles transitam

usam máscaras contra gases

;

tóx

i

cos


(há uma guerra silen

-o-ciosa

dentro das palavrasdentrodalinguadentrodasbocasdentrodosolhos

dentro

do silêncio).

Post Scriptum: Eis que escrevendo este post, me bato acidentalmente com belíssimo prefácio de cummings (eu que já adorava esse outro prefácio dele)- que vale bem como mensagem de ano novo nesse ano doido que se inicia.